quinta-feira, 7 de fevereiro de 2013

Depressão X Memória

O psiquiatra e psicoterapeuta Dr. Ururahy Barroso explica a relação 
entre a depressão e a falta de memória

De que forma a depressão altera a memória do indivíduo?

Muita gente imagina que, na depressão, a pessoa tem uma diminuição da conexão. Mas é o contrário. Pesquisas recentes mostram que o cérebro de um deprimido tem mais conexão que o de uma pessoa em estado normal. Tudo indica que se trata de um mecanismo neurológico para aumentar ainda mais a concentração em torno do sofrimento para que esse seja o provocador, até que novas formas de pensar sejam estimuladas. Há uma diminuição da dopamina, que é o neurotransmissor do prazer, e da serotonina, que é o neurotransmissor do bem-estar. Com isso, acontece uma diminuição da atenção e da motivação, essenciais para a formação da memória.

Levando-se em conta os fatores citados, como funciona o mecanismo de memorização durante o período de manifestação da doença?

A memorização começa pela atenção, que pode sofrer alterações em todos os transtornos emocionais e mentais. Mesmo na ansiedade simples, que pode ser substituída por expectativa, a atenção pode sofrer oscilações. A motivação é o propósito da atenção. Se esse propósito é fraco, ele não vai gerar energia suficiente para se manter a atenção. A carga emocional é o que estou sentindo no ato da memorização. Na depressão, a carga emocional funciona como uma âncora para mantê-lo concentrado no aspecto do sofrimento. O foco é perdido e haverá mais dificuldade para a memorização.

A pessoa que sofre de depressão tende a recordar com mais facilidade situações negativas?

Os estímulos são registrados na memória mediante repetição ou através de carga afetiva. O que evoca a memória, por sua vez, são as emoções. Então, é muito mais difícil você querer lembrar-se de algo alegre sentindo-se triste e vice-versa. Na depressão, as recordações não são bloqueadas, mas sim redirecionadas. A pessoa busca um bom momento e isso é redirecionado para um mau momento em virtude da sensação emocional negativa. Por isso, a quebra do estado emocional através de exercícios físicos e de novas posturas é tão estimulada, atualmente.


E como acontece esse redirecionamento?

Os nossos pensamentos se manifestam através de modalidades visuais, auditivas e cinetésicas. Quanto mais intensas as nuances de cada modalidade, melhor será a emoção. O contrário também vale. Com a diminuição de neurotransmissores, há uma queda da intensidade das lembranças, que se alteram para imagens cinza e desfocadas. A perda da intensidade da lembrança se dá porque o cérebro realiza o que se chama de dissociação, quando uma lembrança boa é vista bem de longe e desfocada, enquanto uma lembrança ruim é vista bem de perto e focada. Com isso, tem-se um aumento da intensidade das lembranças ruins e uma diminuição de intensidade das boas.

As perturbações da memória afetam que outros mecanismos do corpo da pessoa depressiva?

Temos uma sequência lógica no nosso corpo. Com a alteração emocional, há uma alteração neurológica que leva a perturbações do sistema endócrino e imunológico.

Como é o modo de pensar da pessoa com depressão?

Na depressão, o modo de pensar é extremamente apático e negativo. Muitas vezes, a apatia e a indiferença se sobrepõem ao negativismo. Porque, mesmo para ser negativo, requer esforço, movimento, defesa, enquanto que para ser apático ou indiferente, basta ficar quieto. A quietude do deprimido é caracterizada pelo silêncio, pela ausência de movimento e pela solidão. Tudo passa de forma vaga, sem foco e sem atenção, fazendo com que a memória presente seja gravemente comprometida. Há uma espécie de "zoom" nas memórias negativas - evocadas pelas emoções negativas - que, por sua vez, sustentam as emoções negativas, que disparam as memórias negativas, criando um círculo vicioso.

É possível treinar a memória contra a depressão, desviando a mente de lembranças negativas através de algum tipo de exercício?

Com certeza. Todos nós devemos ter, como ícones na nossa mente, três situações alegres e divertidas, que podem ser evocadas para quebrar um estado inicial de depressão. O cérebro, uma vez acionado nesse sentido, gera imediatamente uma sensação boa que acaba desviando as lembranças negativas.

Existe uma memória genética da depressão?

A memória genética da depressão permanece pouco definida porque, cada vez mais, se pensa em multifatores. Alguns estudos sugerem que existiria um grupo de genes que influenciaria na produção natural da serotonina. Mas, cada vez mais, se descobre que, mesmo com a carga genética, o meio, desde a infância, o comportamento dos pais, o modo pelo qual a pessoa vai reagir perante a vida, as crenças mentais e outros fatores é que irão determinar a força da influência desses genes. O que falta na depressão é felicidade. A nossa razão de viver deve ser a felicidade. Quando estamos desfocados disso, ficamos sujeitos a influências do nosso sistema neurofisiológico, que acaba influenciando o nosso estado emocional. Escolher ser feliz, independentemente do que acontece ao redor da pessoa, favorece uma saúde emocional que sempre irá contribuir para uma boa memória.

Dr. Ururahy Botosi Barroso realiza pesquisas sobre a relação entre os transtornos mentais e emocionais e a felicidade.



Esta entrevista faz parte da sétima edição da revista Treine sua Memória, publicada mensalmente por Coquetel. Com conteúdo diferenciado, Treine sua Memória, traz sempre um especialista falando sobre os poderes, mitos e curiosidades da mente humana, além de jogos e dicas para turbinar seu cérebro. Procure já a sua na banca mais próxima!


Nenhum comentário:

Postar um comentário

Deixe seu recado! =)